----------- Nícolas "Pavarotti" Poloni--------- Lucas "Domingo" De Lellis -------- Thiago "Carreras" Nestor -----------

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

A Imprecadora (Somente leitura)


A IMPRECADORA


Sou puta, sim, puta e anti-social
mas chupo o dedo sem unha
com boca de pelúcia

Podem vir, que venham
todos os síndicos e o padre viado
fabricante de mendigos
o importador de anões

Pode vir a negranhada
os homens-fêmeas
a indiarada, os baianos
judeus, nordestinos
o lixo, a bosta, o esgoto

Passaram antraz na minha boca
na minha gengiva
torturaram meu rosto
minha arcada dentária
seios nádegas olhos nariz
queixo pescoço garganta
cérebro ânus vagina
comeram toda a carne do meu corpo
vodu na boca lábios gengiva

Enfia o farol na buceta
da puta-mãe de vocês
no cu da puta vaca
da tua mãe-esgoto

Sou eu aqui
dormindo na rua
saia verde camisa preta
Todos precisam de mim

[Do livro Baque, 2007]

O psicólogo Fabio Weintraub tem um destaque no cenário da poesia modera. Sua poesia tem como principal característica a reflexão social. Em “A imprecadora” notamos a presença de uma temática nada “adequada” no fazer poético, porém, muito questionadora para o social. Inadequada no sentido de tratar como tema uma puta, sim, uma puta; uma daquelas mulheres que “alugam” o seu corpo por pouco (ou nem tão pouco assim) dinheiro. Aquela mulher que fica a margem, que é discriminada, negada pela sociedade. Todos sabemos da presença dela, e, ínsita o autor, todos usufruímos dos seus “dotes”. A poesia de Fabio causa um desconforto (diferentemente de outros autores) convida o leitor a pensar, a questionar esta sociedade que, suga, que usa os principais atributos das pessoas, sem o mínimo de sentimento, nem mesmo gratidão. É esse o questionamento em “A imprecadora”. Cabe a nós, leitores, perceber quem é “a imprecadora” em nossas vidas, pode ser o cobrador do ônibus, o empacotador no mercado, o lixeiro, todo aquele que pensamos não nos ter valor nem merecimento de nossa atenção. É para mim, a reflexão deixada por Fabio Weintraub em “A imprecadora”.

Postado por Thiago "Carreras" Nestor

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Ash to ashes

O mundo pós-moderno é um caos. Não busco aqui saber se caos vem para predicar positiva ou negativamente o sujeito da oração, simplesmente, sentencio (como tantos outros já o fizeram): o mundo pós-moderno é um caos.

Em primeiro lugar, que diabos é a pós-modernidade? Se me permitem expressar minha mais modesta opinião, a pós-modernidade é uma invenção capitalista para fomentar a globalização pós Guerra Fria: “...Demos um salto a frente! Não somos mais só modernos, agora somos PÓS-MODERNOS! VIVA!”, poderíamos ouvir de algum cidadão alienado por aqueles mais poderosos que assim o querem.

Deixando o ataque à burguesia de lado, mais ainda correndo num sentido próximo, deveríamos nos questionar: é bom estarmos na pós-modernidade? Como sabemos, uma evolução não necessariamente é algo benéfico, podemos perfeitamente evoluir para algo pior do que já éramos ou estávamos vivendo. Aí surge o bom e velho saudosismo: “que tempo bom quando eu era criança. Não havia cerca ao redor do meu terreno. Não havia polícia no portão da escola. Brincávamos felizes até às 9 da noite e depois voltávamos a pé para casa, temendo, no máximo, que o cachorro de alguém tivesse escapado da corrente.” Hoje em dia? Bom, creio que a pós-modernidade e o caos instaurado estão sendo muito bem representados por Berman e Bauman no campo crítico, e por muitos outros no campo artístico. Gostaria de salientar aqui, dois poemas de Régis Bonvicino que, na minha opinião, expressam muito bem essa história toda:

IN A STATION OF THE METRO

The apparition of these faces in the crowd;
Petals on a wet, black bough.

Abruptos tiras ocultos na multidão;
Tiros na nuca, um corpo espúrio no chão.

O LIXO

Plásticos voando baixo
cacos de uma garrafa
pétalas
sobre o asfalto

aquilo
que não mais
se considera útil
ou propício

há um balde
naquela lixeira
está nos sacos
jogados na esquina

caixas de madeira
está nos sacos
ao lado da cabine
telefônica

o lixo está contido
em outro saco
restos de comida e cigarros
no canteiro, sem a árvore,

lixo consentido
agora sob o viaduto
onde se confunde
com mendigos

BONVICINO. Régis. Página órfã, Martins, Martins Fontes, São Paulo, 2007.


Para mim, aqui temos dois temas recorrentes do mundo pós-moderno: a violência gratuita e o detrimento do ser humano.

Creio que a imagem recorrente em ambos os poemas poderias ser a de um corpo no chão. No primeiro, representando o homem morto; no segundo, o homem esquecido. Parecem fatos tão naturais a nossos ouvidos e olhos que, mesmo quando vemos acontecer a metros de distância, nem nos espantamos mais. O ego aflora em cada um; não existe mais nós; agora é apenas eu, eu, eu...O outro está ali, caído no chão, perdido no chão. É o homem-morto, é o homem-lixo, e ambos vão apodrecer até não sobrar mais nada: do pó ao pó.

Cada vez mais fica mais claro ser esse o futuro de todos nós: apagando lentamente ou queimando de uma vez só. Não importa mais. O mundo pós-moderno é um caos e, assim sendo, o caos é banal.


Postado por Nícolas "Pavarotti" Poloni

segunda-feira, 6 de outubro de 2008

Tempos modernos

É no mínimo interessante como o novo (ou até o não-tão-novo-assim) sempre chega e divide as pessoas entre os que o aceitam e os que não aceitam. É natural ao ser humano, que não nos corrijam agora os estudiosos da essência humana, ser saudosista daquela realidade que muitas vezes nem vivemos, mas que sabemos ser muito melhor que a nossa. Outras ideologias, outros comportamentos, outras liberdades, outros deveres, outras manifestações, tudo parece ter sido infinitamente melhor quando nós não estávamos lá. O novo então, ou que venha para ser melhor que esse passado ausente, ou que venha para ser imagem e semelhança desse mesmo tempo.
Berman, em seu texto Modernidade: ontem, hoje e amanhã (Tudo que é sólido se desmancha no ar. A aventura da modernidade. São Paulo: Schwarz, 1986) , faz uma crítica ao modernismo e à modernidade e, ao querer ver o modernismo voltando as suas raízes com o intuito de nutrir-se delas e se renovar, nada mais é que um sentimento saudosista e a busca de um antropofagismo modernista (por mais que isso nos pareça familiar).
Fazer o modernismo de amanhã crescer buscando fonte no modernismo passado.
Saudosismos à parte, vimos emergir em tempos mais recentes críticos como Focault (citado por Berman) e Zigmund Bauman. Ambos tomam a crítica da sociedade contemporânea levantando questões sobre as (i)mobilidades de diversas categorias presentes no nosso dia-a-dia (mesmo que não as percebamos de cara).
Trazendo o contexto teórico aos poemas de Paulo Leminski, mais especificamente ao livro La vie en close (1991), tomamos como parâmetro dois de seus poemas.


OUVERTURE LA VIE EN CLOSE


em latim
“porta” se diz “janua”
e “janela” se diz “fenestra”

a palavra “fenestra”
não veio para o português
mas veio o diminutivo de “janua”,
“januela”, “portinha”,
que deu nossa “janela”
“fenestra” veio
mas não como esse ponto da casa
que olha o mundo lá fora,
de “fenestra”, veio “fresta”,
o que é coisa bem diversa


já em inglês
“janela” se diz “window”
porque por ela entra
o vento (“wind”) frio do norte
a menos que a fechemos
como quem abre
o grande dicionário etimológico
dos espaços interiores


Nesse poema, usamos como base o trecho em que Berman comenta sobre “...a internacionalização da vida cotidiana - nossas roupas e objetos domésticos, nossos livros e nossa música, nossas idéias e fantasias -, que espalha nossas identidades - por sobre o mapa-múndi” (p. 29). Cremos que aqui nos deparamos justamente com essa internacionalização moderna de que nos fala Berman. Leminski se utiliza de palavras em três línguas diferentes: latim, inglês e português e, ao mesmo tempo que as põe em contato, as exclui por seus significados e derivações. Também recorre à volta às origens de Berman, não no sentido próprio do retorno ao “primeiro modernismo”, mas à pura volta à etimologia das palavras, buscando a raiz principal da nossa língua: o latim. O termo sendo modificado do latim até chegar ao português brasileiro nos passa a idéia da fluidez que Bauman tanto conceitualiza e traz como recorrente na sociedade (pós)moderna. A palavra que, para Focault é a representação do poder, fixo e imutável (até que se prove o contrário), se torna um paradoxo a partir da conceitualização de Bauman, que pensa na sua liquidez e subversão (qualidade do que é móvel).


COMO ABATER UMA NUVEM A TIROS


sirenes, bares em chamas,
carros se chocando,
a noite me chama,
a coisa escrita em sangue
nas paredes das danceterias
e dos hospitais,
os poemas incompletos
e o vermelho sempre verde dos sinais


Aqui recorremos à modernidade inspirada no surgimento das máquinas e na frase de Berman: “...algumas das mais importantes variedades de sentimentos humanos vão ganhando novas cores à medida que as máquinas vão sendo criadas” (p. 9). Ao longo do poema, Leminski vai enumerando sentidos (visão, audição) a partir das imagens (“sirenes, bares em chamas”) e a eles dá uma cor de sangue, uma cor vermelha, tudo refletido na imagem da noite, a noite moderna, a noite do século XX (e XXI). Se pensarmos bem, em que outro tempo a noite poderia ser descrita a partir de imagens do caos que se consolidam na cor vermelha de sangue? Obviamente, só depois de termos todos os elementos propulsores a esse caos e, no caso, nos tempos atuais, onde a imagens de carros se chocando, sirenes tocando, sangue em danceterias e hospitais se fazem presente. Aqui é onde mais bem vemos emergir as construções modernas influenciando na poesia e alterando a cor dos sentimentos do poeta, que sabe como abater a nuvem branca de um céu negro da noite, usando o vermelho, que mancha ambas as cores.

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

João Cabral em perspectiva


O poeta

No telefone do poeta

Desceram vozes sem cabeça

Desceu um susto desceu o medo

Da morte de neve.

O telefone com asas e o poeta

Pensando que fosse o avião

Que levaria de sua noite furiosa

Aquelas máquinas em fuga

Ora, na sala do poeta o relógio

Marcava horas que ninguém vivera.

O telefone nem mulher nem sobrado,

Ao telefone o pássaro-trovão.

Nuvens porém brancas de pássaros

Acenderam a noite do poeta

E nos olhos, vistos de fora, do poeta

Vão nascer duas flores secas.


João Cabral de Mello Neto



A perspectiva


“ (...) o futuro da poesia reside em sua própria fonte.(..) Inicialmente, é preciso reconhecer que, qualquer que seja a cultura, o ser humano produz duas linguagens a partir de sua língua: uma racional, empírica, prática, técnica; outra, simbólica, mítica, mágica. (...)” (p. 35) é com a afirmação de Edgar Morin que começamos a análise do poema “O poeta” de João Cabral de Mello Neto. A primeira linguagem do poema de João Cabral seria, superficialmente falando, a de um poeta perdido com suas idéias sem conseguir encaixá-las de uma maneira significativa para o leitor, causando um desconforto, uma estranheza, isto segundo Morin, seria a linguagem racional. Porém a poesia não se limita a esta primeira linguagem. Em “O poeta”, João Cabral fala da própria poesia (metapoesia), ou seja, do fazer poético. Ele apropria-se de língua prática, racional, utilizando símbolos conhecidos para tentar expressar o desconhecido, aquela sensação que só ele sente. Ele fala do moderno, utilizando elementos como o telefone e o avião para representar a modernidade. Na primeira estrofe fica clara essa intenção: “No telefone do poeta/ desceram vozes sem cabeça” – a intenção do poeta é de mostrar a inspiração, vinda como “uma ligação” de vozes desconhecidas, de lugares estranhos, inesperados. O trecho: “Ora, na sala do poeta o relógio/ Marcava horas que ninguém vivera.”, Mostra a situação vivida pelo poeta no fazer poético, ou seja, a sala do poeta seria a sua poesia, marcando horas que ninguém vivera, pois a poesia não é vivida e sim sentida. “E nos olhos, vistos de fora, do poeta/ Vão nascer duas flores secas.” Mostra o fim da atitude do poeta os olhos vistos de fora, seria o olhar do público, e as duas flores secas, seria a própria poesia pronta, seca porque o poeta não fica satisfeito com a sua produção, que já nasce morta, já nasce ultrapassada devido à efemeridade do mundo moderno em que vive. É, pois, uma crítica (ou ­mais uma crítica) à modernidade e todo seu avanço tecnológico e maquinário que invade(ia) as cidades, mudando completamente a vida da população (para pior, segundo muitos poetas).


Postado por "Os Três Tenores"


Referências

MELLO NETO, João Cabral de. pedra do sono. In:_____. Obras completas:volume único. Rio de Janeiro: Nova Aguillar, 1995
MORIN, Edgar. Amor Poesia Sabedoria. São Paulo: Bertrand Brasil, 2003.


segunda-feira, 8 de setembro de 2008

Eu passarinho

A arte está presente em todos aqueles que querem (ou melhor, que necessitam) sair de si próprios, expandir, transcender-se, ir além. E a poesia é a expressão máxima da arte. Porque a poesia não está presente apenas no poema, ela pode estar presente no romance, na pintura, na arquitetura, na música, na flor, nos olhos, na parada de ônibus, atrás do balcão, no semáforo, numa palavra, no silêncio, num passarinho. Enfim, onde houver o desejo ou a necessidade de ir além.
Lembro que, quando criança, li em um pano de prato comemorativo aos 80 anos do Mario Quintana, aquele poema “Todos esses que aí estão/Atravancando meu caminho,/Eles passarão.../Eu passarinho!”. Achei a coisa mais boba que eu já tinha lido. Porém, aquilo não saía da minha cabeça, possivelmente por sua musicalidade. Passados alguns dias, veio aquele estalo, que os cultos chamam de “experiência estética”, ou algo assim, e consegui ver a transcendência que a poesia é capaz de proporcionar. Ao tomar conhecimento desta capacidade da poesia, podemos finalmente dizer: “Eu passarinho”.

Por Wagner "Domingo" Machado

Arte e Poesia - Outra (ou a mesma) perspectiva

Começo o texto a partir de um título que separa a poesia da arte. Trazendo para termos mais conhecidos, é como se escrevêssemos o título: Esporte e futebol. A poesia, bem como outras representações, está dentro da “categoria” arte, como o futebol está dentro da “categoria” esporte. Deixando tal equívoco de lado e também a arte em geral, gostaria de ser mais específico e falar sobre a poesia como conceito indefinido. Por que indefinido? Porque tentar definir poesia é como discutir o sexo dos anjos, nunca haverá uma única resposta ou ainda, uma única resposta correta. Octávio Paz, em “O Arco e a Lira” (1982), define ou tenta definir poesia, compreendendo diversas palavras que se completam, que se contradizem, que se significam por si só...Enfim, na verdade, a partir desse texto e de tantas discussões sobre o conceito de poesia que vemos e ouvimos por aí, podemos pensar que poesia tem definições finitas que compreendem tudo que a imaginação humana puder criar e tudo que a alma humana puder sentir. Filosófico, ridículo, engodo, epifania, arte, independente do que pensamos sobre os diversos significados que encontramos ou criamos para o que vem a ser poesia, creio que qualquer definição deveria começar com um simples: Para mim, poesia é... E o resto vai de cada um.

Por Nícolas "Pavarotti" Poloni

Arte e Poesia

Definir ou conceituar "Poesia" é uma tarefa que pode ser considerada praticamente impossível, tanto é que, para Platão a poesia era algo divino. Segundo ele, nenhum ser – humano era capaz de criar poesia. Ela surgia no instante em que o poeta, possesso e inspirado por um deus, escrevia os seus belos poemas. Os poetas de hoje em dia já não acreditam mais na “definição” de Platão. Ao perguntarmos para qualquer poeta, “o que é poesia?” ele nos responderá: “90% transpiração e 10% inspiração”. Na poesia, cada palavra tem seu papel não apenas por seu significado, mas também por seu ritmo, pela sua sonoridade, pela forma como se relaciona com as outras palavras. Fatos esses que tornam a tarefa de conceituar poesia uma complicação. O poeta busca inspiração em tudo que o rodeia, assim como o artista plástico. É comum vermos obras de arte inspiradas em poesias e poesias inspiradas em obras de arte. Isso ocorre pura e simplesmente porque a poesia também é arte. É uma arte diferente, lida com a palavra, ritmo, porém é tão trabalhosa quanto todas as outras, requer disciplina, esforço e muita sensibilidade para que o trabalho seja eficiente. Creio que essa dificuldade de definir o que é poesia é que a torna tão fascinante.

Por Thiago "Carreras" Nestor